Consolidação do mercado educacional

Consolidação do mercado educacional

Fernando Barão

Muito tem se falado sobre a tendência de consolidação do mercado educacional privado. Esta já é uma realidade há algum tempo para o Ensino Superior. Depois de passar por um crescimento acentuado no final dos anos 90 e início dos anos 2000, o setor do Ensino Superior apresentou condições bastante favoráveis à consolidação. Assim, ao longo de boa parte da última década e também durante a década em curso foram inúmeros os casos de aquisição de faculdades de pequeno e médio porte por grandes organizações educacionais, tanto nacionais quanto estrangeiras.

O crescimento expressivo da Anhanguera, em um primeiro momento, foi o termômetro mais perceptível dessa tendência. Sua aquisição pela Kroton, criando um dos maiores grupos educacionais do mundo, somente confirmou e acentuou essa visão. A tendência do Ensino Superior é continuar sendo consolidado, reduzindo-se os espaços, no mercado, para as instituições de pequeno e médio porte. Estas deverão ter uma sobrevida mais expressiva em nichos específicos de mercado.

A pergunta que se faz, diante dessa análise, é: e o Ensino Básico, deverá passar também por esta consolidação?

É fato que o ritmo de fusões e aquisições no Ensino Básico ainda é muito lento. Há notícias que pipocam aqui ou ali, há interesses declarados de fundos em entrar no setor, há grandes empresas, como a Abril, que têm conseguido entrar no mercado comprando algumas escolas; mas, no fim, por ora temos muita fumaça para pouco fogo. Por quê?

As macrocondições do mercado parecem, à primeira vista, se mostrar propícias à sua consolidação:

1) Mercado com alto potencial de crescimento. O número de alunos em escolas particulares vem aumentando nos últimos anos de forma consistente. Cada vez mais a educação é reconhecida como a mola propulsora do desenvolvimento do país e, mais do que isso, a principal condição diferenciadora para uma carreira profissional de sucesso.

2) Pulverização das escolas. Cerca de 75% das escolas de São Paulo têm menos do que 200 alunos. Essa é uma condição altamente favorável à consolidação.

3) Causa nobre. São muitos os investidores que têm preferência por investir em educação – incluindo fundos de investimento.

4) Escolas com nível crescente de lucratividade. As instituições privadas, em geral, têm melhorado sua rentabilidade nos últimos anos.

5) Players com recursos para aquisições. Em especial os fundos de investimento, além de ter interesse, têm recursos financeiros para bancar sua entrada no mercado através de aquisições de escolas.

O conjunto de condições acima exposto nos leva à necessidade de entender esse aparente paradoxo: por que, com tantas condições favoráveis, o processo de consolidação anda a passos tão lentos?

Há de se entender que o mercado do Ensino Básico é altamente específico. Isso porque contém muitas características que não são encontradas em outros mercados. Quem trabalha em escolas sabe o quanto isso é uma realidade. Quem vem de outros setores sabe a dificuldade em se adaptar a este novo habitat.

Muitas causas podem ser apontadas para essa resistência que o mercado tem apresentado à consolidação, mas podemos destacar as que nos parecem as mais importantes.

1) Apego ao negócio – boa parte dos donos de escola tem uma relação com seu negócio que vai muito além da simples análise capitalista. Há um vínculo emotivo/afetivo que as impedem de pensar em vender, ou, mesmo que pensem, as leva a não concretizar os negócios. É como se a escola fizesse parte de sua família e, assim sendo, não pudesse ser vendida.

2) Pretenso monopólio da qualidade – cada escola é, na ótica de seus proprietários, única e diferenciada das demais. Com isso, não tem como se misturar, não tem como manter seu padrão de qualidade em outras mãos. Isso, muitas vezes, atrapalha e /ou impede o processo de negociação de cotas.

3) Modelo tributário – existe uma quantidade muito grande de escolas que são associação sem fins lucrativos ou estão no Simples, modelos tributários que não podem ser continuados nas mãos de compradores maiores, como fundos de investimento. Isso cria uma discrepância entre o resultado atual observado pela escola e o projetado pelo comprador no novo modelo tributário, menos vantajoso. Isso leva a um confronto de expectativas entre as partes.

4) Valorização excessiva – em grande parte dos casos o dono da escola tem uma expectativa de valor bem acima da realidade, por conta dos anos de dedicação e à relação pessoalizada que têm em com a marca. São muitos os casos de processos de negociação que se encerram por conta da decepção ocasionada por processos de avaliação de cotas.

5) Escolas não vendáveis – parte expressiva do setor – e mais expressiva ainda dos alunos – é composta por escolas confessionais, fundações ou entidades filantrópicas. Muitas daquelas que seriam as escolas mais atraentes para investidores não são vendáveis.

6) Reação de pais e alunos – o setor educacional básico é particularmente sensível a vendas e fusões. Há um elo forte entre a imagem da escola e a imagem dos donos perante os clientes. A ideia de venda é vista com muita ressalva por conta disso.

7) Endividamento alto – ainda que o setor tenha melhorado sua rentabilidade nos últimos anos, o nível de endividamento ainda é alto, o que dificulta, em muitos casos, as negociações das cotas.

Esse quadro pode vir a mudar, mas não visualizamos que isso vai ocorrer de forma rápida. A consolidação do mercado do Ensino Básico deverá acontecer, mas não se deve esperar isso a curto prazo.

(Putzodiac/iStock.com)

menu
menu
Atualizado: 06/08/2020